A mobilidade em nossos equipamentos essenciais tem sido cada vez mais trivial, entretanto, a cada novo equipamento que a tecnologia lhe oferece, você terá uma nova bateria com um novo carregador específico que terá que ser carregada em algum lugar.
GPS, SPOT, máquina fotográfica, filmadora, aparelhos para ouvir música, celular, leitor de eBook, tablet, laptop… e assim por diante. Uma excelente opção é resumir todos esses equipamentos em um único smartphone, ou coisa parecida.
Apesar do smartphone ser eficiente em suas funções, é bom lembrar que não terá a mesma performance que cada um desses equipamentos oferece de forma isolada. Mesmo assim, para quem deseja, por exemplo, produzir fotos ou vídeos um pouco melhores, poderá comprar acessórios como lentes e microfones que se adaptam ao seu aparelho. Outros podem preferir escrever de forma mais agradável utilizando teclados externos, ou ainda podem adquirir pequenas caixas de som para um áudio de qualidade e tantos outros acessórios que melhoram o desempenho do smartphone em alguma função específica que deseja.
Por outro lado, concentrando todas as suas necessidades em um único equipamento, se algo acontecer com ele todos os recursos e facilidades estarão perdidos. Isso sem falar no significante aumento em consumo de eletricidade que esse aparelho irá sofrer durante a viagem.
É importante saber suas reais necessidades para não ficar sem carga no meio do caminho, dependendo da situação terá que economizar o uso de seus aparelhos. Se em seu roteiro pretende dormir em pousadas ou albergues, poderá carregar suas baterias durante a noite. Se utilizar um único aparelho para tudo é bom ter sempre uma ou duas baterias extras conforme a intensidade de uso, ou então, lançar mão de bancos de baterias, que nada mais são que bateiras maiores (ou um conjunto de baterias) que, uma vez carregadas, podem carregar baterias menores, geralmente através de uma saída USB.
Para quem deseja ter ainda mais autonomia, os dínamos modernos, instalados dentro do cubo da roda dianteira, têm uma eficiência incrível, e praticamente não pesam nas pedaladas. A saída é de 6 volts, 3 watts, mas através de um adaptador se converte em um carregador USB (5 volts com 500 mA).
Conhecemos um belga em Ladakh que utilizava seu smartphone para tudo e, através do dínamo, após algumas três ou quatro horas de pedal, o aparelho já acusava carga completa (de 40% chegava aos 100% de carga). Atualmente ele utiliza um sistema ainda mais elaborado que carrega uma bateria maior para depois, também através de uma saída USB, carregar seu aparelho. Com isso consegue uma saída mais potente (5 volts com 1.000 mA).
A eletricidade é um bem cada vez mais acessível em todo o mundo. Sem ela o consumo, mola mestre do mercado de capital, fica muito limitado. São raros os locais do mundo onde não temos acesso à eletricidade.
Em nossas últimas viagens pedalamos por regiões com sérias restrições na oferta de eletricidade e apesar dos problemas que isso nos gera, ficamos felizes em conviver com pessoas pouco influenciadas pelos meios de comunicação de massa e, consequentemente, pelo consumismo.
Uma das vertentes de nosso projeto para divulgar o cicloturismo no Brasil são viagens de aventura. Enquanto em nossos guias oferecemos informações precisas, com duas casas depois da vírgula, para incentivar aventuras de bicicleta, editamos um documentário de cada viagem que fazemos com o fim de dar dicas, disseminar o conhecimento de locais pouco comuns para viajar e aguçar o interesse dos cicloturistas em viagens de aventura.
Não somos fortes, por isso temos que ser estritos em nossos equipamentos, mesmo assim, na última viagem levamos quase cinco quilos em equipamentos elétricos e eletrônicos para poder bem coletar as imagens dos documentários (quase o dobro do peso de nossa barraca).
As baterias de nossos equipamentos trabalham com 7,2 volts (quase um padrão entre as câmeras), isso é quase o dobro dos 3,7 volts da bateria de um smartphone. O dínamo não é uma solução para nós.
No motor home a energia solar tem se mostrado a mais eficiente para nosso estilo de vida (econômico e independente) e decidimos utilizá-la em nossas viagens de bicicleta, pois, no geral, para carregar uma bateria, não é necessário uma fonte poderosa de eletricidade, e sim constância de fornecimento de eletricidade por longo período.
Em Ladakh, reaproveitei uma placa solar dobrável que utilizava no motor home (com saída de 12 volts, 12 watts, 1.000mA). Reconheço que meus trabalhos de “reaproveitamento” a deixaram bem compacta, mas ficou delicada demais para ser utilizada durante as pedaladas. Só podia abrir a placa quando parava para almoçar ou armar o acampamento.
Em nossa última viagem testei uma compacta placa solar dobrável de 500 gramas que produz até 7 watts. Apesar de menos poderosa, deu conta do recado, pois era compacta e resistente o bastante para ser carregada todo o tempo por cima da bagagem, com a vantagem de continuar sendo útil mesmo em caminhadas ou dias de descanso. Com a abundância de sol e economia no uso dos equipamentos, nunca ficamos sem eletricidade, pois conseguimos carregar até uma bateria e meia por dia. Se tivéssemos que viajar por lugares menos ensolarados como o Reino Unido, teríamos que utilizar placas maiores, pois sua eficiência cai muito em dias nublados.
A tecnologia sempre promete vantagens e vende o sonho de que a vida fica mais fácil com ela. Talvez sim, mas depende de como nos deixamos levar pelos avanços tecnológicos.
“Acho interessante observar que a tecnologia trouxe facilidades e conveniência, mas não conseguiu diminuir minha bagagem. Ao contrário, de certa forma, ela aumentou minha dependência de certas facilidades.”
Não é sem uma grande dose de saudosismo que me lembro das minhas necessidades e soluções elétricas quando fiz a volta ao mundo em 1993. Meu consumo de eletricidade se limitava a quatro equipamentos: câmera fotográfica, odômetro, walkman e uma lanterna.
A câmera era reflex, quase totalmente mecânica, tinha uma pilha pequena como a de um relógio para alimentar o fotômetro e durava por muito tempo, assim como a pilha do odômetro.
Nas noites solitárias, depois do jantar, me permitia gastar um pouco das pilhas do walkman ouvindo uma fita K7 inteira, de toda forma, sempre tinha comigo uma caneta tipo bic para poder rebobinar a fita sem gastar pilha (se você não compreende como uma caneta economiza pilha é porque você é muito novo, pergunte para alguém mais velho que ele te explica).
Apesar de “supermoderna”, com sistema de instalação na cabeça e tudo mais, ao invés de LED minha lanterna usava lâmpadas de filamento que consomem pilha como uma draga. Em países longe da linha do Equador, durante o inverno, eu entrava na barraca por volta das 17 h, quando o sol se punha, e só saía às 08 h do outro dia, após surgirem os primeiros raios de luz. Sem pilhas recarregáveis, lançava mão da luz charmosa, aconchegante e barata de uma vela de cera.
Naquela época não precisava verificar ou responder e-mails, pois não havia internet. Se precisasse me comunicar tinha que pegar um papel e escrever uma carta. Em três anos e meio de viagem fiz somente 1.200 fotos, quantidade que podemos fazer em menos de uma semana nos dias de hoje.
Acho interessante observar que a tecnologia trouxe facilidades e conveniência, mas não conseguiu diminuir minha bagagem. Ao contrário, de certa forma, ela aumentou minha dependência de certas facilidades.
Para a maioria das pessoas, nossa lista de equipamentos eletrônicos é um exagero, mas temos um propósito para tudo isso. Veja a foto de nossas bicicletas saindo da estação Avaroa em direção ao Sul de Lipez. Estávamos carregando comida para dez dias e água para três, mesmo assim não parecem bicicletas exageradamente carregadas.
Numa aventura de bicicleta, buscamos justamente sair da zona de conforto. Aprendemos que as restrições nos deixam mais fortes, pois nos fazem ver que conseguimos sobreviver com pouco e quando voltamos para o motor home percebemos que nossa vida é abundante.
Às vezes, o melhor não é ter um equipamento a mais e sim aprender a viver sem a necessidade dele.