Antes de ler este texto, informamos: ele está repleto de ironia. A ironia é um estilo de escrita usado por inúmeros autores e escritores, do presente e do passado, a fim de provocar reflexões um pouco mais ácidas. Em nenhum momento, usa-se de ironia para ofender, fazer juízo de valor ou criticar quem quer que seja. Ao contrário, às vezes se vale dela para revelar algumas verdades que, comumente, nos negamos a ver e das quais somos vítimas.
Há pouco tempo, o senso comum passou a ser criticado enquanto ideia pouco complexa ou inválida. Por vezes, é confortável e pouco arriscado pensar como ‘todo mundo’, porém, mamãe sempre disse que eu não era ‘todo mundo’. Então, para sobreviver, passei a refletir um pouco mais profundamente, ao invés de, simplesmente, seguir a massa.
Ao contrário do que se pensa sobre o senso comum, que seja inofensivo, diante da velocidade e alcance dos avanços midiáticos, uma ideia mal formulada ou uma pseudo informação pode, em uma fração de segundos, se tornar uma “verdade”, admitida e sustentada por milhões de pessoas que “acham” o mesmo a respeito.
E assim, pode-se, de maneira inoportuna, comprometer modos de pensar, agir e ser.
A falta de profundidade e conhecimento faz nascer eruditos a cada clique.
Nosso histórico colonial, de igual maneira, segue sendo sustentado pelos modelos de pensamento que, na melhor das hipóteses, reforçam o quanto nosso povo têm pouca ou nenhuma noção de seu passado recente.
Exemplo disso é uma mania brasileira, banhada em senso comum, recorrente e cansada. Ela trata de atribuir falsos títulos de rei ou rainha a um(a) jogador(a) de futebol, a uma personalidade da música, a um personagem que teve, quiçá, 2 minutos de fama por motivos nada nobres, para não me estender mais.
A cada pouco, nascem reis e rainhas do futebol, rainhas dos baixinhos e grandinhos, reis da música, rainhas do rebolado, reis e rainhas do funk, reis e rainhas da cocada preta ou branca, e a lista é tão imensa quanto a ilusão da magnificência.
Fato é que “reis” e “rainhas”, no Brasil, temos aos borbotões. A eles, somam-se séquitos servis, multidões de vassalos hipnotizados que, de concreto, muito pouco ou quase nada recebem em troca enquanto súditos fiéis.
Aliás, diga-se de passagem, vassalos e demais súditos apenas empobrecem cada vez mais, em todos os sentidos, mantendo o glamour de vossas majestades, vale lembrar. Segui-los, não faz de mim ou de você, membros da corte, não se iluda. E, em tempo, reis e rainhas pouco são executivos, quase nada mandam, a não ser em suas pompas, regras de etiqueta caduca e eventos com um ar de esnobismo bastante fora de moda.
Ah, e se vier à mente a figura do bobo da corte, aviso que ele era apenas um funcionário do palácio e, talvez, o único a poder criticar o rei sem correr riscos imediatos. Mas, na primeira crise de raiva ou de ego, era o alvo ‘inútil’ mais próximo e mais provável.
Há dias atrás, o falecimento de Filipe Mountbatten, consorte de Isabel II do Reino Unido, evidenciou uma legião de admiradores brasileiros tão bem atualizados que só passaram a saber quem era esta personalidade quando do ocorrido. Ironias à parte, fica a reflexão.
O que de tão impressionante reis e rainhas, fictícios ou não, têm feito para tornar melhor e real a vida daqueles que não tiveram a mesma ‘sorte’, pouco sabemos. Quando penso na ideia de realeza, me vem à mente seus sinônimos mais interessantes e concretos: prodígio, honra e ser surpreendentemente admirável.
E, é claro mas não tão óbvio, que logo entre minhas referências a figura da bicicleta assume este carisma e predicado. Por quê será?
A bicicleta desponta no século XXI como a realeza de maior impacto social, econômico, ambiental, cultural e simbólico. Mais que tudo, ela já não é mais tendência como avisávamos há 12 anos passados, quando começamos em novembro de 2010, há 112 edições atrás.
Ela, a realeza da bicicleta, se declara prodigiosa por ser a melhor solução energética economicamente viável e socialmente justa, como já disse em outras matérias.
Vou além, como se fosse preciso, que ela tem sido usada inteligentemente para demonstrar que a alternativa em mobilidade, agora, é o carro, tadinho. E, alguns mais desavisados, irão replicar aos gritos: e o carro elétrico? Responderei, muito gentil, me afastando aos poucos em cima de minha bicicleta: ele não é para todos(as)… e minha voz e meu vulto irão desaparecer no horizonte.
O uso da antonomásia “Rainha da Mobilidade” não é necessário, porquanto a bicicleta é a forma mais próxima do real e natural caminhar, garantida pela propulsão humana do pedalar. Até rimou de tão real!
Vale ressaltar que, quando cito o feito de ser surpreendentemente admirável, me rendo à bicicleta por ela ter ultrapassado seus 200 anos, acreditem, bem mais do que a mais nobre das senhoras inglesas de Mayfair.
A realeza da bicicleta transcende horizontes geográficos e atravessa o tempo apontando inúmeros futuros possíveis. Ela não se constrange diante de fronteiras que insistem em separar nações, homens e mulheres. Ela, mais que tudo, é símbolo de liberdade, civilidade, esperança, e como não dizer, de possibilidades infinitas tanto para quem dela se vale quanto para quem ainda não.
Ela, a bicicleta, é motivo de colocar incontroláveis sorrisos em pais e filhos de todas as idades, do mais humilde recanto ao endereço mais afortunado.
Ela leva todos, a todos os lugares.
Ela não exige reverência. Ela não cobra tributos.
Ela sempre promove, exemplarmente, quem dela se acompanha.
E, ela é tão real quanto os sonhos de quem queira ir além do que lhe foi imposto.
Viva a bicicleta, realmente. Sempre!